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NEUTROPENIA FEBRIL



DEFINIÇÂO

A Neutropenia Febril é quando a contagem de neutrófilos está abaixo de 500 cél/microL ou menor que 1000 cél/micro com previsão de queda para menos de 500 cél/micro nas próximas 48hs. O diagnóstico de febre é dado quando a temperatura oral isolada é maior que 38,3oC ou maior que 38oC, se mantida por mais de 1 hora ou uma medida única axilar maior que 37,8oC, podendo ser o único sinal e/ou sintoma devido a diminuição da resposta inflamatória pela depleção de neutrófilos.

O paciente neutropênico sem indícios de febre, e com sinais clínicos de infecção já pode ser diagnosticado com neutropenia febril. Excepcionalmente, pacientes que esteja em esquema quimioterápico entre o décimo e vigésimo dia após administração da medicação devem ser considerados neutropênicos, mesmo sem os resultados dos exames laboratoriais, devido a efeitos dos agentes quimioterápicos em induzir uma neutropenia.

Vale salientar que toda neutropenia febril deve ser considerada uma infecção grave e ser tratada como tal. 

ETIOLOGIA

As principais causas de neutropenia estão relacionadas à falência ou à ineficiência da produção da medula óssea ou de liberar os neutrófilos, levando à destruição dessas células no sangue e/ou nos tecidos. Porém, nem sempre essas causas ocorrem de forma dissociada, podendo, em alguns casos, todos esses mecanismos estarem envolvidos concomitantemente.

As neutropenias ainda podem ser classificadas em neutropenias hereditárias, que possui como causa a neutropenia familiar benigna, familiar grave e familiar cíclica, ou adquiridas. 

Os principais causadores envolvidos são:

SANARFLIX, 2020

FISIOPATOLOGIA

Neutrófilos são células granulocíticas responsáveis pela resposta imune imediata do organismo a infecções bacterianas e fúngicas, correspondendo a, aproximadamente, 60% dos leucócitos circulantes e sua produção costuma ocorrer na medula óssea durante um período de 10 a 14 dias. Uma vez liberados na circulação sanguínea, costumam sobreviver por apenas 4 a 8 horas até encontrarem um alvo para fagocitar e destruir e são direcionados a esse patógeno infectante através da sinalização de antígenos liberados pelo próprio microorganismo, processo denominado de quiomiotaxia. Após a localização do infectante, o neutrófilo invagina-se de modo a englobar o patógeno, processo chamado de fagocitose, e, com isso, formando um complexo vacuolar contendo o microorganismo fagocitado (fagossoma). A partir desse ponto, o complexo é fusionado ao lisossoma, formando o fagolisossoma que, através da ação enzimática, destrói o patógeno fagocitado.

Neutropenia é complicação frequente do tratamento quimioterápico do câncer, chegando a alcançar uma incidência entre 10 a 50% para pacientes com neoplasia sólida e pode acometer até 80% dos indivíduos com neoplasia hematológica. A quimioterapia, através de ação citotóxica direta, suprime a habilidade da medula óssea em manter uma adequada produção de neutrófilos e, também, reduz a atividade fagocitária dos neutrófilos circulantes. Tanto a severidade quanto o risco de infecção são inversamente proporcionais à quantidade de neutrófilos no sangue periférico. Pacientes com contagens de neutrófilos < 500 células/mm³ possuem uma chance maior de infecção quando comparados com indivíduos com contagens ao redor de 1000 células/mm³, por exemplo. O tempo de neutropenia é igualmente determinante no risco de infecção; pacientes com neutropenia prolongada (exemplo, > 7 dias) apresentam risco adicional de infecção. No entanto, não é apenas pela indução de neutropenia que o paciente sob tratamento oncológico tem risco aumentado para infecções; a quimioterapia também provoca quebra da barreira mucosa do trato gastrointestinal, facilitando a translocação de patógenos para o sangue. Além disso, a própria imunossupressão induzida pelo câncer e a frequente necessidade de implante de cateteres venosos para realização do tratamento, o que acaba por criar uma “porta de entrada” para germes colonizadores da pele, são fatores que potencializam o risco de infecção no paciente em quimioterapia.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS 

Ainda que as manifestações se inclinem a formas mais brandas, o enfermo ainda corre muitos riscos, uma vez que tal “leveza” nos sintomas é um indicativo de mau funcionamento do sistema imunológico do paciente.

Em linhas gerais, o sintoma mais comum é a febre isolada e persistente. Além disso, lesões são sinais associados significativos: na pele, na mucosa, no fundo do olho e na região perirretal são as lesões mais corriqueiras. Vale a pena ratificar a possibilidade dessa manifestação na área de inserção do cateter utilizado para tratamento quimioterápico, uma vez que esse é um forte indicativo de Neutropenia Febril para pacientes imunossuprimidos por essa terapêutica. Ademais, é muito importante lembrar que, em caso de suspeita de Neutropenia Febril, não devemos realizar o exame de toque retal, uma vez que pode haver uma transferência indesejada de bactérias para uma região já fragilizada e, por consequência, provocar uma piora do quadro.

 DIAGNÓSTICO

O principal exame para o diagnóstico de Neutropenia é o Hemograma completo. Com a contagem de neutrófilos, o paciente que apresentar < 500 células/microL, ou < 1.000 células/microL com previsão de queda para < 500 células/microL nas próximas 48h, é considerado neutropênico.

Quanto à febre nesse enfermo, deve-se fazer a aferição oral, e é atestada a neutropenia febril com uma temperatura igual ou superior a 38,3ºC. Surge, então, um questionamento: e se não tivermos um termômetro oral disponível? Bom, nesse caso, deve-se considerar que a temperatura axilar é, em média, 0,5ºC mais baixa que a oral. Dessa forma, a temperatura axilar limite é de 37,8ºC.

ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO

Após o diagnóstico, o paciente precisa passar pela estratificação de risco, para que a equipe da Emergência possa estabelecer a melhor conduta terapêutica. Sendo assim, foi estabelecida pela Multinational Association of Supportive Care in Cancer -MASCC- um escore de referência:

(https://miphidic.com/2016/01/20/febrile-neutropenia-management-part-ii/)

 

Essa tabela identifica os pacientes de Baixo e Alto Risco. Mas como? É simples! Se o paciente apresentar um escore igual ou maior que 21 pontos, ele é considerado de baixo risco.

è Mas vale ressaltar que essa é uma tabela de referência, ou seja, critérios clínicos também podem enquadrar o enfermo em grupos de risco.

AVALIAÇÃO CLÍNICA E LABORATORIAL

Sobre a avaliação clínica, precisamos avaliar aspectos gerais e infecciosos. Para um entendimento mais global da situação do paciente, é necessário levantar dados referentes a sintomas de mucosite, presença de cateter profundo (em caso de pacientes tratados com quimioterápicos), frequência cardíaca e respiratória, dor e eritema. Como a Neutropenia Febril fica muito evidente a partir de sinais e sintomas de infecção (o que também pode indicar a gravidade do quadro), alguns fatores, como Histórico de Hospitalização, História de colonização ou infecção documentada e sinais de infecção localizada, merecem especial atenção.

A respeito da avaliação laboratorial, além do hemograma com contagem de neutrófilos, é recomendado que sejam realizados exames de hemocultura, com no mínimo dois sets em sítios diferentes ou, com presença de cateter profundo, um set para cada lúmen do cateter e um outro para veia periférica; de Ureia e Creatinina, para avaliar o funcionamento renal; de Aminotransferase e Bilirrubina, para avaliar o funcionamento hepático.

Além disso, é importante solicitar exames complementares, que irão variar de acordo com a situação do paciente. Sendo assim, não é incomum a realização de exames de imagem de tórax, sumário de urina ou busca de toxinas específicas de bactérias mais nocivas.

TRATAMENTO 

Uma vez que os exames de identificação bacteriana não são rápidos o suficiente, além de a Neutropenia Febril ser caracterizada como uma emergência oncológica, o tratamento é Antimicrobiano Empírico. Dessa forma, em última hipótese, é possível controlar o quadro da infecção até termos dados mais precisos para o tratamento.

Para pacientes de Baixo Risco, o tratamento é ambulatorial (a internação não é necessária) e são administrados Ciprofloxacina e Amoxicilinaclavulanato. Caso o paciente já esteja em um processo profilático com uma Fluoroquinolona, não é necessária a prescrição de Ciprofloxacina.

Para pacientes de Alto Risco, em especial os portadores de hipertensão, pneumonia, infecção em pele ou partes moles e mucosite, é recomendada a administração de Beta Lactâmicos Antipseudomonas e, em regime posterior, de Vancomicina ou similar.

REAVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA 

Alguns casos específicos podem demandar novos exames para realizar uma reavaliação diagnóstica. Sendo assim, em casos de Febre persistente (superior a 3 dias ao longo do tratamento): Hemocultura + TC de Tórax e de Seios da Face; para queixas abdominais constantes: busca de toxina de C. difícil e + TC de abdome; para pacientes instáveis após 4 dias de tratamento: acréscimo de cobertura contra Multirresistentes + Cobertura Antifúngica + Beta-D-Glucana e Galactomanana.

REFERÊNCIAS:

Portal PEBMED https://pebmed.com.br/neutropenia-febril-persistente-terapia-antifungica-empirica-e-sempreindicada/#:~:text=Neutropenia%20febril%20%C3%A9%20uma%20emerg%C3%AAncia,ficam%20suscet%C3%ADveis%20a%20infec%C3%A7%C3%B5es%20graves. Acesso em: 22 jan. 2022

Pracchia LF, Costa SF. Neutropenia febril. In: Martins HS, Brandão Neto RA, Scalabrini Neto A, et al. Emergências clínicas: abordagem prática. Barueri: Manole; 2017. 12a.ed. p.1256-1267

Pracchia LF, Costa SF. Neutropenia febril. In: Martins HS, Brandão Neto RA, Scalabrini Neto A, et al. Emergências clínicas: abordagem prática. Barueri: Manole; 2017. 12a.ed. p.1256-1267

CLÍNICA médica: hematologia, volume 2. 12. ed. Sao Paulo (SP): Ed. SJT, 2012. 168p., il. (SJT preparatório para residência médica). ISBN 9788564013100.

PULS, Henrique Alencastro. RESUMOS DE EMERGÊNCIA #05: NEUTROPENIA FEBRIL. Disponível em: https://isaem.net/resumos-de-emergencia-05-neutropenia-febril/. Acesso em: 06 set. 2021.

Autores:

Bruno Teixeira Machado

Medicina UFBA – 4 semestre

Diretor de Ensino da LAON

Walter lima de Barros Neto

Medicina UFBA

Diretor de comunicação da Laon

Hipocondríaco em tratamento



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